Tina (Eva Melander) tem uma aparência diferente de todas as pessoas que já conheceu em sua cidade e em seu trabalho. Na alfândega da fronteira de seu país, ela tem 100% de sucesso ao detectar traficantes, entre outros delitos de quem tenta contrabandear em seu turno. Exceto que pela primeira vez ela não consegue detectar se uma nova e única pessoa está mentindo, é culpada ou não. E para sua surpresa maior ainda, essa única pessoa, tem uma aparência extremamente parecida com a sua.
Passando a questionar sua capacidade, sua realidade e toda sua vida, ela engata em uma jornada de autodescoberta, confusão e questionamento enquanto se aproxima e conhece esse outro indivíduo, Vore (Eero Milonoff), que parece conhecer muito mais do mundo e do que ela realmente é, do que si.
Por ser um filme sueco+dinamarquês independente, mistura folclore local com elementos da cultura pop porém de uma maneira totalmente inovadora e inesperada. A grande revelação sobre o que de fato é Tina e Vore, é extremamente bem vinda sem descompassar com o resto de um roteiro que constrói muito bem suas personagens e sua mitologia.
Mesmo servindo de alegoria para questões sociais como os preconceitos referentes a raça, gênero, sexualidade, etc… não trabalha esses temas de maneira clichê ou mastigada para o espectador. A monstruosidade feminina também é um ótimo adicional ao histórico de estudo cinematográfico na área. Tina é uma ótima protagonista e uma ótima personagem, cheia de nuances humanas demais.
Socialização e pertencimento, liberdade e adaptação ao conformismo são apenas alguns dos temas que percebemos em Border. A relação com um mundo cruel e niilista, e uma súbita esperança ao encontrar os seus, faz com que os dois primeiros atos do filme sejam de belíssima construção e ambientação. Infelizmente no terceiro ato são colocados elementos de “thrillers criminais” que acabam por quebrar o ritmo e as questões morais, parecendo uma conveniência de finalização, ao invés de seguir por um caminho que já parecia certeiro.
Ali Abbasi foi certeiro ao fazer a adaptação do curta metragem “Grans” (do mesmo diretor do original Let the Right One In, John Ajvide Lindqvist que assina em conjunto o roteiro desse). Além da criatividade, possui belíssima fotografia e paisagens invejáveis. O realismo fantástico misturado com o horror fazem com que Border não seja esquecido facilmente, e é uma daquelas experiências que por um motivo o outro, nos fazem apreciar sua existência.
Seres foram feitos para transgredir fronteiras e é assim que um cinema bem feito faz, traduzido em criações como Border. Apesar de não ser perfeito, aborda temas atuais, questiona e escancara questões que por muito ainda precisam ser traduzidas de forma ou outra pelo mundo. E nada como o horror e a arte para concretizar isso de forma estranha, monstruosa e bela ao mesmo tempo.
O filme fez sua estreia em outubro de 2018. Dirigido por Ali Abbasi, possui 110 minutos que pelo menos valem a sua curiosidade. Com atuações ótimas, boas cenas e criatividade em alta, Border merece carinho ao mesmo tempo que apontamos seus erros.
Nome: Border
Direção: Ali Abbasi
Roteiro: Ali Abbasi, John Ajvide Lindqvist, Isabella Eklöf
Elenco: Eva Melander, Eero Milonoff, Jörgen Thorsson, Ann Petrén, Sten Ljunggren
Ano de Lançamento: 2018