NatLola (Milena Smit) tem o sonho da família tradicional completa que se esvai por um aborto traumatizantes. Meses depois ela e seu marido Adolfo (Jaime Lorente) optam pela adoção de crianças gêmeas que se destacam das outras no orfanato com uma educação ultra-religiosa, na Espanha nos anos 80. O terror psicológico foi baseado em curta-metragem de mesmo nome.
Na nova rotina o casal começa a perceber comportamentos estranhos das crianças, gerando conflitos e acusações de culpabilidade entre eles. Como educá-las, corrigi-las ou até puni-las? A religião que parecia ser uma coisa inofensiva passa para extremos: elas vivem em prol da bíblia, levando tudo o que lêem para seu uso literal.
Ficando em casa o tempo todo para cumprir seu novo papel, Lola é quem sofre e testemunha a maior parte das consequências e absurdos. Seu marido ausente se coloca sempre do lado das crianças, plantando a semente da dúvida de que talvez ela esteja apenas exagerando e deve ser grata pela oportunidade de exercer a maternidade, revelando que além de ser um péssimo companheiro também acaba deixando a desejar como pai.
Este é o primeiro longametragem de Rubin Stein que também assina o roteiro. Com belas paisagens e um casarão grande demais que encurrala as personagens, temos uma ótima construção da tensão e do desenrolar dessa dinâmica familiar. Os elementos religiosos são bem aproveitados mesmo fazendo contrapontos com a visão pessimista e agnóstica de Lola, que não acredita em um Deus que tirou a vida de seu bebê. Os embates filosóficos e práticos tomam proporções ainda mais assustadoras elucidando questões morais que só pioram. Faz sentido com a proposta.
Aqui religião e política se misturam e vamos entendendo aos poucos seu impacto, principalmente quando focamos na saúde mental da protagonista. O horror ao invés de demônios, vem acompanhado de cenas impactantes enquanto versos bíblicos são recitados. Mesmo que já conheçamos outras histórias onde atos terríveis são cometidos em nome de Deus, aqui seu estranhamento é ainda pior ao serem perpetuados por crianças.
Temos ótimas atuações por todas as partes e personagens humanos demais. Torcemos, ficamos com raiva, sentimos empatia e também desejamos o mal. Seu tom dramático se sobressai e não são necessários elementos sobrenaturais para firmar o quanto é possível sentirmos medo em situações da vida real que parecem inofensivas.
A crueldade, para além das crianças, é uma crítica da maternidade compulsória e outras amarras morais e sociais impostas às mulheres. Além obviamente de criticar sem medo, o fanatismo religioso. Quase nada sutil, as decisões tomadas tornam-se desconfortáveis e para algumas conveniências de roteiro podem trazer momentos arrastados com falas muito descritivas e explicações que poderiam continuar no âmbito dos detalhes, nuances e imagens. O terceiro ato do filme e seu desfecho até surpreendem e combinam com o amargor constante.
Com seu lançamento em 2023, Tin&Tina foi elogiado como um respiro inovador de impacto no cinema de horror espanhol. Apesar de não agradar todos os críticos, gerou comparações com obras da produtora A24. Com cenários belíssimos e uma abordagem bem intencionada, é uma ótima pedida para quem se interessa pelas temáticas aqui mencionadas.
Nome: Tin & Tina
Direção: Rubin Stein
Roteiro: Rubin Stein
Elenco: Milena Smit, Jaime Lorente, Carlos González Morollón, Anastasia Russo, Teresa Rabal, Ruth Gabriel
Ano de Lançamento: 2023